segunda-feira, 1 de abril de 2019

O Golpe chamado de Revolução


Eu estava cursando o segundo ano de jornalismo quando, durante uma aula de História, o professor Marcos Cezar, indagou à classe o que havia acontecido em 31 de março de 1964. Então, eu respondi que havia ocorrido o Golpe de Estado. Eis que ele, com certa fúria, respondeu “Golpe de Estado pra você, que pode falar isso hoje. À época os Militares o chamaram de Revolução”.

Pois é, o Brasil é um país tão sui-generis que golpe vira revolução, mentira ganha eleição, bizarrice dá audiência na televisão... Até bem pouco tempo, quando da proximidade da data, nossos canais televisivos e demais órgãos de imprensa meio que escamoteavam o assunto e, quando muito, salvo raras exceções, o tratavam meio que an passam.

Já este ano, devido a equivocada intenção, mais uma, do Presidente Jair Bolsonaro, em “comemorar” a data, o assunto tem repercutido. Há aqueles que o defendam mesmo sem tê-lo vivido, sem se quer ter lido a respeito, uma vez que estão hipnotizados por palavras de ordem que insistem na máxima nazista, de Joseph Goebbels, “uma mentira contada mil vezes vira verdade”. Sim, porque eles querem nos fazer crer que torturadores são heróis. Já os que lutaram pela liberdade e a preservação dos direitos, este sim são subversivos! São comunistas!  

Em se tratando do Golpe de 1964, seus idealizadores o justificaram por conta da corrupção que assolava o país. Hoje, decorridas algumas décadas, percebemos que não era bem assim. Não se tratava de uma questão moral, já que, como é de conhecimento público, há documentos que comprovam a influência norte-americana em todo o processo.

Os seus defensores sempre gostaram de dizer que no período do Regime Militar não havia corrupção. Hoje, sabe-se que o que não havia era a informação. Pois cercearam a liberdade de imprensa, a liberdade dos artistas, a liberdade dos professores e todos àqueles contrários ao regime. Números da CNV (Comissão Nacional da Verdade), em estudos finalizados em 2014, apontaram que 434 pessoas morreram por conta do regime, sendo que deste total, 210 foram consideradas desaparecidas, bem como mais de cinco mil exilados. O estudo ainda trata das práticas de tortura “Essa comprovação decorreu da apuração dos fatos que se encontram detalhadamente descritos no relatório, nos quais está perfeitamente configurada a prática sistemática de detenções ilegais e arbitrárias e de tortura(...).”

Claro que este é um assunto extremamente delicado, por consequência, é melhor eu não me estender muito. O ideal é que você tire suas próprias conclusões, por exemplo, por meio de livros como Não És Tu Brasil (Marcelo Rubens Paiva), Carlos Marighella: o inimigo número um da ditadura militar (Emiliano José), Ditadura militar, esquerdas e sociedade (Daniel Aarão Reis Filho), a série Ditadura, de Elio Gaspari, e mais uma estante cheia deles. Se você não curte leitura, não tem problema, há ótimos filmes também: O Que é isso Companheiro? (Bruno Barreto, 1997), Batismo de Sangue (Helvécio Ratton, 2006), Araguaya – A Conspiração do Silêncio (Ronaldo Duque, 2004), o excelente documentário O Dia Que Durou 21 Anos (Flávio Tavares, 2011) ou o lúdico, até com um ângulo diferente, O Ano Em Que Meus Pais Saíram de Férias (Cão Hamburger, 2006), entre tantos outros.

Nunca nos esqueçamos que pessoas morreram para que eu, para que você, e para que todos nós possamos gozar da liberdade que temos hoje. Se fazemos, ou não, o bom uso desse direito é uma outra história.

Eu posso, aqui no meu blog – olha isso, meu blog –, escrever sobre o que eu quiser, como eu quiser, no momento em que eu quiser. Naturalmente, assumindo minhas responsabilidades. Porém, se ainda estivéssemos vivendo o regime ditatorial meus textos teriam que ir para um censor, se é que eu teria autorização de escrever, que decidiria se podia ou não ser publicado.    

E antes que você diga que a internet é livre, leia sobre a China, sobre a Coréia do Norte...

Para ouvir no Spotify:
https://open.spotify.com/user/22hkib5bes45l4jgjkjiwnxqa/playlist/5tOwiPSDNYEKYabmCfIFQG?si=CccsQRJHQySFL50uVDczNQ

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