sexta-feira, 1 de julho de 2011

Que bom que existe um Woody Allen

“Aqui, Joven Pan Paris, às margens do Sena, junto a Maison de la Radio, clima agradável, com os termômetros marcando 20 graus,”, assim se apresentava o saudoso jornalista, Reali Júnior falecido em 9 de abril, correspondente, entre outros, da referida rádio paulistana, no Jornal da Manhã. Aquele jornal famoso por informar as horas “Agora 6 horas e 30 minutos”, ao qual uma voz dizia: “Repita”, “seis e meia”. Quem nunca o escutou? 

Eis que assim Reali sempre alimentou ainda mais a minha vontade de conhecer a Cidade Luz. Mais até que filmes e a literatura. Mais que o futebol esplendoroso de Zidane e Platini, este bordão me instiga e continua povoando minha imaginação. Aproveito pra opinar que, ao lado de Buenos Aires, Paris tem o nome mais bonito já atribuído a uma cidade.

Agora falando do filme Meia Noite em Paris, Woody Allen acertou em cheio ao levantar o eterno conflito de que o passado é melhor que o presente, ao menos pra muita gente. Eu, provavelmente, sou uma dessas pessoas que enxergam mais qualidade em muitos aspectos. Por vezes sou saudosista, até nostálgico, mas, na medida do possível, sempre pronto a olhar pra frente, mesmo quando a inércia é lisérgica, a preguiça é retumbante ou as perspectivas não são as mais favoráveis.

Inteligentemente Allen brinca com mundos paralelos e coloca o escritor Gil, interpretado por Owen Wilson, na sua chamada “Era de Ouro”, que é quando cada um considera sua época favorita, no caso, a Paris dos anos 20. Antes disso, Gil tem de lidar com o fato de ser um bem sucedido roteirista de Hollywood, mas frustrado pela qualidade de seu trabalho, que classifica como superficial. Por conta disso está escrevendo um romance e acredita que a Cidade Luz é a inspiração ideal para finalizá-lo. Além da questão profissional tem uma noiva (Rachel McAdams) no melhor estilo patricinha fútil, os sogros, que não o veem com bons olhos, bem como um casal de amigos da noiva, cujo homem é um ex-professor dela e de uma arrogância ímpar.

Uma vez em seu mundo de sonhos Gil encontra com seus heróis, os escritores F. Scott Fitzgerald e Ernest Hemingway, além do músico Cole Porter, do pintor Pablo Picasso e do cineasta Luis Buñuel. Mas é por Adriana (Marion Cottilard), amante e musa inspiradora de Picasso, que Gil sente seus maiores conflitos internos, tamanha sua beleza e carisma. Ele está prestes a se casar, mas se vê apaixonado por esta nova e sublime mulher.

Allen mostra o quanto é inquietante e até perturbador esta necessidade de (re) viver o passado. Esta busca incessante, põe Gil a refletir, sobretudo, por seus amores. Existe um amor no passado que, talvez, seja melhor deixá-lo por lá, guardado como uma incrível lembrança. Não necessariamente que tenha que ser resgatado, mas que ele possa servir de combustível a novas conquistas, uma vez que seu tempo passou, ficou em algum lugar e não é preciso debruçar-se sobre ele o tempo todo.     

A busca pelo novo pode ser tão gratificante quanto um flashback. Entender que o que o cerca é a oportunidade de fazer acontecer, de se reinventar. E se não acontecer exatamente como planejado, tenta-se, porque não, uma terceira via. Gil capta as nuances e sutilezas impetradas pelo destino e busca se encontrar.

Tudo muito bem conduzido por um Woody Allen revigorado e que consegue fazer de Paris a sua tão querida e bem retratada Nova York. Há diálogos deliciosamente divertidos, sem ser pueris. O humor típico do autor, sem exageros, mas que garante ao espectador ótimas risadas.


2 comentários:

  1. Aquele amor pertence ao passado. E é lá sua morada. Está lá para ser revisitado sempre que assim um desejo incontrolável se apresente. E ele é até muito mais bonito visto à distância. Mas para ser vivido no presente, o Amor precisa ser de sua época.

    Ótima percepção do filme, ótimo texto Silvanão.

    Grande Abraço!

    ResponderExcluir
  2. "É saudade então.
    E mais uma vez,
    de você fiz o desenho mais perfeito que se fez"

    ResponderExcluir